Pelas ruas vagueiam cães danados, passeiam cães
amigos: companheiros ou praga na Lisboa do século XIX?
RESUMO
A historiografia portuguesa, com poucas exceções, e ao contrário do que tem
acontecido nos Estados Unidos e em outros países europeus, não tem dado
centralidade aos animais não-humanos como sujeitos culturais. Todavia, também
em Portugal, no contexto urbano, tanto as posturas municipais, quanto os
relatos de estrangeiros, indiciam uma relação conflituosa entre habitantes
humanos e não-humanos que moldou os quotidianos das cidades. De facto, o grande
desenvolvimento de Lisboa no século XIX implicou uma gestão da coabitação
destes diferentes habitantes da capital portuguesa.
Esta comunicação procurará identificar e descrever alguns dos actores que
se envolveram na problemática da gestão da vida quotidiana na cidade de Lisboa
no que concerne às interações entre cães e Lisboetas na segunda metade do
século XIX, quando o amistoso e útil cão se tornou um potencial inimigo para a
saúde pública. Visões diferentes colidiram em relação às medidas que deveriam
ser tomadas para controlar os cães vadios, potencialmente propensos à raiva,
interagindo na delineação das políticas urbanas. A cidade não era vista, apenas,
como um lugar onde os cães com raiva deveriam ser erradicados, mas, também,
como um local de violência contra os animais, em geral, e contra os cães, especificamente.
Como moldaram os cães o espaço da cidade e as práticas dos seus habitantes ao
longo do tempo no contexto dos esforços políticos para controlá-los e
excluí-los? Como podem as pragas urbanas contribuir para a compreensão da
história da cidade? Estas são algumas das questões que se pretende discutir.
NOTA BIOGRÁFICA
Inês Gomes (CIUHCT/FCUL) é doutorada em História e Filosofia das Ciências (FCUL),
mestre em Georrecursos (IST) e licenciada em Biologia (FCUL). É, desde 2017,
investigadora de pós-doutoramento no CIUHCT.
A sua investigação
iniciou-se na área da ecologia, tendo-se debruçado no doutoramento, defendido
em 2015, sobre o património científico, que, de uma forma geral, se encontra
numa situação de grande vulnerabilidade, desconhecendo-se o que existe, onde
existe e qual o seu estado de conservação. Em particular, a sua tese centrou-se
sobre a génese e evolução das colecções escolares de história natural associadas
aos liceus portugueses, à luz da história das ciências e da educação, partindo
da cultura material como ferramenta para aprofundar o conhecimento da prática
científica e pedagógica. Aspectos ligados à forma como as colecções de história
natural foram utilizadas, assim como a sua importância actual, quer para as
respectivas instituições, quer para a comunidade científica e para a sociedade
portuguesa, em geral, foram, igualmente, centrais no projecto desenvolvido.
Mais recentemente, tem
estado envolvida em projectos na área da história ambiental e da história
urbana das ciências, nomeadamente nos projectos “Introductions, invasions and
control measures of plant pests in Southern Europe. An interdisciplinary comparative approach from
the 19th century onwards” e “Visions of Lisbon: Science, Technology and
Medicine and the Making of a Techno-Scientific Capital, 1870-1940”.
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